Modelos de gestão centralizada de tesouraria: aspectos a ter em conta do ponto de vista de preços de transferência

Máquina de calcular, lapizeira e folha de contabilidade
Sou CFO da entidade-mãe de um grupo de empresas em Angola e gostava de ser esclarecido sobre as implicações fiscais, nomeadamente de preços de transferência, associadas à adopção de um modelo de gestão centralizada de tesouraria.
Num ambiente económico marcado por restrições ao financiamento, instabilidade cambial e eminentes alterações legislativas relevantes em matéria fiscal, os grupos empresariais enfrentam um escrutínio por parte da Administração Geral Tributária cada vez mais apertado em matéria de Preços de Transferência, particularmente no que respeita a operações financeiras intragrupo.
De facto, em resultado dos investimentos efectuados pela AGT, tanto ao nível dos seus recursos humanos como tecnológicos, tem-se verificado uma pressão crescente para o alinhamento das práticas intragrupo neste tipo de transacções com o princípio de plena concorrência e as melhores referências de mercado disponíveis.
De acordo com a Lei, o processo de gestão da liquidez entre entidades de um mesmo grupo deve obedecer a critérios de mercado, ou seja, deve replicar os mesmos termos e condições que terceiros independentes levariam a cabo entre si, nomeadamente ao nível das taxas de juro aplicadas, períodos de carência, maturidade, risco de crédito, garantias e senioridade.
Em Angola, onde a volatilidade cambial e as restrições ao movimento de capitais se revelam condicionantes fundamentais de qualquer política de gestão financeira, este alinhamento é particularmente pertinente.
Quando bem implementado, um modelo de gestão centralizado de tesouraria - suportado por documentação robusta, políticas uniformes e contratos intragrupo claros - permite:
■ Reduzir significativamente o risco de ajustamentos fiscais;
■ Obter maior controlo sobre os fluxos financeiros e a exposição cambial;
■ Optimizar o uso da liquidez, reduzindo a dependência de financiamento externo; e
■ Melhorar a posição negocial com fornecedores e instituições financeiras. Estes benefícios exigem, no entanto, uma base técnica e documental rigorosa, que inclua:
■ Definição de uma metodologia de pricing clara, consubstanciada em análises económicas e de benchmark;
■ Selecção de uma entidade centralizadora com a substância económica efectiva adequada para o efeito;
■ Parametrização dos sistemas financeiros para assegurar rastreabilidade e controlo.
■ Celebração de contratos intragrupo.
■ Elaboração de um manual de políticas de tesouraria que possa servir de referência interna na organização.
Mais do que uma tendência, a centralização da gestão da tesouraria é um imperativo estratégico para grupos que valorizam a conformidade e a sustentabilidade financeira.
Ignorar os desafios de Preços de Transferência associados à gestão centralizada de tesouraria é um risco - enfrentá-los antecipadamente é uma oportunidade de geração de valor.
Edição 829 do Expansão, de Sexta-feira, dia 06 de Junho de 2025 (Saiba mais aqui)
Maria M. Torres, Senior Manager de Tax Transfer Pricing da KPMG Angola