Sábado, Agosto 16
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Rússia/Ucrânia: Somadas as expectativas e os riscos, o encontro de Trump e Putin foi "positivo", mas quanto à guerra, o sangue vai continuar a correr

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Rússia/Ucrânia: Somadas as expectativas e os riscos, o encontro de Trump e Putin foi "positivo", mas quanto à guerra, o sangue vai continuar a correr

Tanto Donald Trump como Vladimir Putin têm ganhos para apresentar ao fim do tête-à-tête que teve lugar na sexta-feira, 15, em Anchorage, Alasca, desde logo ao mostrarem ao mundo imagens de dois homens satisfeitos com o seu protagonismo planetário.

Do lado dos derrotados estão aqueles que vão continuar a morrer nas trincheiras da Ucrânia, onde, numa mórbida curiosidade, tanto russos como ucranianos reforçam as linhas da frente para obter trunfos ainda válidos para a mesa das negociações que vão continuar em breve.

Isso mesmo parece estar contido na derradeira frase do Presidente russo antes de abandonar o "Ancoradouro", a tradução para português do nome da cidade norte-americana onde o encontro teve lugar: "Até à próxima, em Moscovo!".

O anfitrião não respondeu de imediato, mas nem sequer foi uma surpresa, porque o próprio já tinha admitido que depois deste histórico encontro, quatro anos depois da última vez que os dois Presidente americano e russo se encontraram, iria à Rússia para continuar a conversa...

E se alguém estava à espera de ter esta manhã de Sábado uma síntese perfeita nas capas dos jornais do resultado desta Cimeira, a desilusão é clara, porque depois de analisado à lupa tudo o que foi e está a ser dito, fica apenas a certeza de que nada está perdido mas também nada ficou resolvido.

E o que fica são mais certezas no âmbito do embrulho deste evento diplomático de dimensão global que do conteúdo, como seja o facto de Vladimir Putin ter chegado a Anchorage e interpretou o seu papel sem mácula, mas Donald Trump pareceu condicionado por pressões que o russo não tinha nem parece ter, que é decidir sem ter de ouvir terceiros.

Não é o caso de Donald Trump, o que ficou claro logo a seguir, quando pegou no telefone e esteve hora e meia a convesar com o Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, claramente a explicar-lhe o que se passou e o que este deve fazer agora se quiser dar passos firmes rumo à paz.

Um desses dados é a cedência de territórios a Moscovo, nomeadamente aqueles que os russos já controlam no leste ucraniano e que, de facto, na sua perspectiva são parte da Federação Russa depois das anexações em 214 (Crimeia) e 2022 (Lugansk, Donetsk, Kherson e Zaporizhia).

Tanto Trump como Putin concordaram que este é o caminho mas o anfitrião fez questão de clarificar que tal sequência, que é fundamental para a paz, depende de Kiev aceitar ou não, o que o norte-americano pode e deverá procurar convencer já nesta segunda-feira, 18, quando o ucraniano o vai visitar à Casa Branca com este como tema único na agenda.

A esse propósito, Vladimir Putin, que admitiu como normal que a Ucrânia tenha garantias de segurança no pós-conflito, uma das reivindicações mais flamejantes de Kiev, deixou um aviso sério aos aliados dos norte-americanos, os países europeus, a quem aconselhou a "não tentarem descarrilar este processo com manobras de bastidores".

Isto na conferência de imprensa que se seguiu ao tête-à-tête, onde se percebeu claramente que tanto Putin como Trump estão conscientes de que nem tudo fica resolvido com o seu entendimento, porque a Ucrânia e a União Europeia com o Reino Unido não estão alinhados nesse propósito.

Na verdade, o mundo ficou a saber mais sobre este encontro nas horas a seguir que no momento em que decorria o "circo" próprio destes grandes momentos para a diplomacia global, nomeadamente na entrevista que Donald Trum deu ao canal Fox News.

Nessa entrevista, o Presidente norte-americano disse que chegou a acordo com Vladimir Putin em "muitos pontos importantes", considerou que se tratou de um "encontro caloroso", o que ficou claro nas imagens do reencontro que correram o planeta de lés a lés... com elogios rasgados ao chefe do Kremlin.

E na sua conhecida impetuosidade, Trump afirmou mesmo, ainda na Fox News, que dava "nota 10" ao "meeting" com Putin, com quem sempre teve "relações de grande proximidade e com quem pode, em conjunto, alcançar grandes conquistas", sendo muito semelhante ao que Putin já tinha dito em termos de sublinhados à proximidade entre ambos.

Mas essa proximidade não terá um efeito prático no desfecho da guerra na Ucrânia se não houver uma resposta de Zelensky nesse sentido, o que terá de resultar das afirmações dos ucranianos nas próximas horas ou dias... e, para já, não está a ser esse nem o tom nem o conteúdo das palavras do Presidente ucraniano.

Isto percebe-se porque, de facto, a posição de Moscovo sobre a saída para a paz no leste europeu não mudou de forma significativa, excepto ao ter admitido como "normal" que Kiev obtenha as suas garantias de segurança, que Putin vê com bons olhos que sejam negociadas, mas mantendo a exigência maximalista na questão territorial e na neutralidade de Kiev assente em acordos de segurança global entre Washington e Moscovo.

Para já, Volodymyr Zelensky também não arreda pé da sua posição mais conservadora, que é não negociar ou aceitar nada que não seja decidido na sua presença e dos seus aliados europeus, incluindo tanto as questões territoriais, onde parece começar a emergir alguma abertura para negociar, e a questão da segurança futura, que Kiev quer que parta da presença de forças ocidentais no terreno.

Perante este cenário, e como tem sido há longos meses, pelo menos desde que Trump chegou à Casa Branca, a 20 de Janeiro deste ano, o momento mais importante será o próximo, porque se alguma coisa ficou claro é que nem os europeus nem Zelensky se mostram impressionados com as posições assumidas por Donald Trump.

Ou seja, os lideres europeus estão convictamente empenhados em enfrentar Trump e manter sobre ele toda a pressão possível para que este não entregue a Putin o que dizem que é de Zelensky...

Sabe-se que Trump passou horas ao telefone após sair do Alasca, com os lideres europeus seus aliados na NATO e com Zelensky, o que demonstra que não está disponível para já para largar a "bomba atómica" sobre eles de forma a fazê-los recuar nas suas exigências: abandonar a Ucrânia, deixar de apoiar Kiev em armas, dinheiro e, principalmente, intelligentsia.

De igual modo, Vladimir Putin, segundo algumas fontes próximas do Kremlin citadas nos canais alternativos das redes sociais, passou horas ao telefone a falar com os seus aliados principais, dando-lhes conta das conversas com Trump, nomeadamente o Presidente chinês, Xi Jinping.

O tal próximo momento "decisivo", muito antes de ser confimada a ida de Trump a Moscovo, que o próprio admite sem "muito em breve", é quando na segunda-feira, 18, Volodymyr Zelensky entrar na Casa Branca, alegadamente para alinhar com o norte-americano os últimos pormenores do seu mapa de cedências admissíveis a Moscovo.

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