Terça-feira, Setembro 9
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Greve dos jornalistas barrada: Quem manda nos tribunais?

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Greve dos jornalistas barrada: Quem manda nos tribunais?

A greve dos jornalistas dos órgãos públicos angolanos foi suspensa por decisão judicial, reacendendo o debate sobre a separação de poderes. A reivindicação era por um aumento salarial de 58%.

A greve dos jornalistas dos órgãos públicos angolanos teria começado hoje. Mas um tribunal de Luandasuspendeu a paralisação que visava protestar sobre aumento salarial de 58%. A providência cautelar decidida em tempo recorde levanta a velha questão de separação de poderes em Angola. Mas os escribas garantem que a luta não acabou.

A providência cautelar foi requerida pela TPA, RNA, Angop, Edições Novembro, TV Zimbo e grupo Media Nova.

No documento, os órgãos de informação públicos alegam que a greve dos jornalistas prevista para esta segunda-feira, viola direitos, liberdades e garantias dos cidadãos por não acautelar os serviços mínimos previsto por lei.

Tribunal suspende greve

O Tribunal da Comarca de Luanda julgou procedente por considerar que os cidadãos estariam privados dos direitos a informação e ser informados.

Para o politólogo Agostinho Sicato, a medida é reveladora da interdependência dos tribunais face ao poder político porque "demonstra que há uma proximidade entre o poder político e o poder judicial."

Já o jurista Agostinho Canando entende que, neste caso, a política se sobrepôs às questões legais. "Não acredito que houve a suspensão da greve por questões legais. Houve questões políticas envolvidas nessa suspensão da greve", refere.

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Perante a aparente colisão entre dois direitos fundamentais, o de greve e o de acesso à informação, Canando sublinha que não se trata de sobreposição, mas de respeito mútuo.

"Quando o empregador não tem bom proceder é necessário que os trabalhadores tomem uma posição. Então, não se trata de colisão ou de prevalecer um direito sobre o outro. Mas de respeitar direitos, liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos, neste caso dos jornalistas, para que outros cidadãos tenham esses mesmos direitos, no caso o direito à informação", esclarece.

Celeridade processual questionada

A rapidez com que a decisão foi tomada surpreendeu, lembrando o episódio recente em que a Ordem dos Advogados de Angola viu suspenso o "Debate Nacional Sobre Pacote Legislativo Eleitoral”.

O jurista Manuel Cornélio explica que as providências cautelares, em teoria, deveriam ser sempre céleres. "Em regra, as providências cautelares são processos de carácter urgente cujas respostas não devem exceder os 30 dias. Mas o que nos tem sido prática é que muitas demoram uma eternidade (...). Isso é que faz os cidadãos perguntarem por que algumas providências saem de ânimo leve e as outras são engavetadas."

Compadrio entre o executivo e o judiciário

A decisão volta a colocar no centro da discussão a separação de poderes em Angola. Cornélio sublinha que a independência existe apenas no papel. "Há uma separação com uma dose elevada ao poder político."

O jurista considera que o poder político está a "asfixiar os demais poderes e o princípio de check and balance acaba por ser totalmente desequilibrado."

Na mesma linha, Sicato reforça que, do ponto de vista prático, o poder judicial não é autónomo. "Não há nenhuma independência do poder judicial. Há, sim, uma dependência direta do poder político."

Jornalistas cumprem decisão

O Sindicato dos Jornalistas Angolanos (SJA) afirma estar a cumprir a decisão do tribunal. O secretário-geral adjunto, André Mossano, explica que o sindicato, enquanto pessoa colectiva, "está sujeito às leis em vigor no país. E pior ainda, nós recebemos a notificação na sexta-feira à tarde, em período de fim de expediente. Não havia hipótese de recurso nenhum nem alternativa a essa decisão de adiar."

Ainda assim, Mossano garante que a luta dos profissionais da comunicação social pública prossegue. "Tão logo nos encontremos livres dos bloqueios desta providência, mantém-se a nossa luta, mantêm-se as decisões que tomamos e a calendarização que fizemos."

Embora não exista acordo fechado entre Governo e sindicato, as negociações foram retomadas. "Acertámos alguns pontos e nós, o sindicato, estamos focados na nossa conquista. A nossa principal conquista defendida nesse encontro é a de maio último, que não foi cumprida pelas entidades patronais em Agosto, tal como estava previsto. Demos alguns passos nesse sentido, ao ponto de termos já marcado a data do próximo encontro, que será sexta-feira."

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